"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



13/05/2014

Aplicação no tempo do nCPC: regime dos recursos nos incidentes




1. Segundo parece, há alguma flutuação jurisprudencial sobre o regime aplicável aos recursos interpostos de decisões proferidas depois de 1/9/2013 em incidentes da instância. O problema decorre do seguinte: o art. 6.º, n.º 4, L 41/2013, de 26/6, estabelece que o nCPC apenas é aplicável aos incidentes que sejam deduzidos a partir de 1/9/2013. Este preceito permite duas leituras:

-- O que vale para os incidentes da instância também vale para os recursos interpostos das decisões que neles sejam proferidas, pelo que o novo regime dos recursos só é aplicável nos incidentes instaurados depois de 1/9/2013;

-- O que vale para os incidentes não vale para os recursos interpostos das decisões que neles sejam proferidas, pelo que o novo regime dos recursos é aplicável a decisões proferidas depois de 1/9/2013 mesmo em incidentes instaurados antes de 1/9/2013.

O recente RP 5/5/2014 orienta-se por esta última posição:

“I - Quando no artigo 6.º, n.º 4, da Lei 41/2013 de 26/6 (Lei que aprovou o NCPCivil) se faz referência a que o disposto no Código de Processo Civil relativamente aos procedimentos cautelares e incidentes de natureza declarativa (onde também se inserem os embargos de terceiro) apenas se aplica aos que sejam deduzidos a partir da data de entrada em vigor da presente lei, apenas tem em vista as normas específicas reguladoras desses incidentes e já não as normas referentes aos recursos dessas decisões.

II - No que tange aos recursos interpostos de decisões proferidas durante a sua tramitação ou da respectiva decisão final, havemos de convocar as normas transitórias respectivas ou, quando estas não existam, fazer apelo às regras gerais referentes a aplicação das leis no tempo.

III - Dado que a única norma transitória sobre recursos respeita somente às acções instauradas antes de 1 de Janeiro de 2008, relativamente às restantes temos, então, de convocar aquelas normas gerais.

IV - Assim, aos recursos interpostos de decisões, em acções pendentes, proferidas a partir da entrada em vigor do novo CPC (1 de Setembro de 2013) aplica-se o regime de recursos decorrente deste novo diploma sempre que não estejam em causa normas que interfiram na relação substantiva.”


2. O acórdão defende aquela que parece ser a melhor solução do caso. Tal como, na L 41/2013, se distingue entre a acção declarativa (art. 6.) e os recursos (art. 7.º, n.º 1), também parece dever distinguir-se entre os incidentes da instância e os respectivos recursos. A fase dos recursos tem suficiente autonomia para que não tenha de seguir, em matéria de aplicação da lei no tempo, o regime que, nessa mesma matéria, vale para a 1.ª instância. Nesta perspectiva, o disposto no art. 6.º, n.º 4, L 41/2013 não abrange os recursos a interpor em incidentes que já se encontravam pendentes em 1/9/2013.

Assim, tendo os embargos de terceiro sido deduzidos em 26/9/2012 e a decisão recorrida sido proferida em 9/10/2013, há que aplicar ao recurso desta decisão o regime constante do nCPC. Dado que os embargos foram deduzidos depois de 1/1/2008 não se lhes aplica a ressalva constante do art. 7.º, n.º 1, nCPC, pelo que ao recurso de uma decisão neles proferida é aplicável o nCPC, incluindo o disposto no art. 671.º, n.º 3, nCPC.


MTS