"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



12/02/2015

Nulidade da notificação do requerimento de injunção



A questão a analisar é a seguinte: será que é aplicável o disposto no n.º 4 do art. 191.º do nCPC à notificação do requerimento de injunção quando sejam preteridas algumas das formalidades prescritas no art. 12.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1/9?

1. Os procedimentos de notificação no âmbito do procedimento de injunção dependem da existência de convenção de domicílio para efeito de realização da notificação do requerimento de injunção em caso de litígio:

– Tendo sido convencionado domicílio, esta notificação é efetuada mediante o envio de carta simples, remetida para o domicílio convencionado, considerando-se a notificação feita na pessoa do requerido com o depósito da carta na caixa do correio deste (art. 12.º-A, n.º 1, do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98);


– Em contrapartida, não havendo domicílio convencionado, a notificação do requerimento de injunção é efetuada por carta registada com aviso de receção, sendo aplicável as disposições relativas à citação (art. 12.º, n.ºs 1 e 2, do mesmo regime jurídico).

Nesta última hipótese, no caso de se frustrar a notificação por via postal, a secretaria do BNI obtém informação sobre a residência ou sede do requerido, mediante pesquisa nas quatro bases de dados referidas no nº 3 do art. 12.º do mesmo regime, e, se obtiver resultados, remete notificação por via postal simples para cada um dos locais encontrados (n.ºs 4 e 5 do citado art. 12.º).

A convenção de domicílio, para ser válida e eficaz, tem de ser reduzida a escrito (arts. 84.º e 364.º, n.º 1, ambos do CC), não bastando o preenchimento do quadrado existente no formulário da injunção relativo à existência de uma tal estipulação.

2. No caso de não existir convenção pela qual as partes tenham estipulado determinado local para, em caso de litígio, serem notificadas ou citadas, a secretaria do BNI deve observar a modalidade de carta registada com aviso de receção, em lugar de realizar a notificação por via postal simples (art. 12.º, n.º 1, do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98). Nesta hipótese, o depósito da carta não é elemento decisivo para que o requerido/notificando tenha conhecimento efetivo da notificação, já que esta modalidade de notificação pressupõe, como se disse, a existência de convenção de domicílio (cfr. art. 12.º-A do mesmo regime jurídico).

Se, por hipótese, não for observado o modo de notificação previsto no art. 12.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98 (carta registada com aviso de receção), existe nulidade da notificação, por inobservância das formalidades prescritas na lei (art. 191.º, n.º 1, do nCPC). Esta nulidade implica a falta do próprio título executivo que, eventualmente, se forme no procedimento de injunção (arts. 726.º, n.º 2, al. a) 1.ª parte, e 734.º, n.º 1, do nCPC).

Poder-se-á argumentar que, por aplicação das regras da citação (em concreto, do n.º 4 do art. 191.º do nCPC), esta nulidade só pode ser atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do notificando. Esta norma parece fazer recair sobre o citando o ónus de provar que a formalidade não observada prejudicou realmente o seu direito de defesa. Repare-se que, no âmbito da ação declarativa comum, o regime da citação, quando haja convenção de domicílio, não dispensa o envio de nova carta registada com aviso de receção ao citando, sempre que o expediente relativo à primeira carta de citação tenha sido devolvido por o destinatário não ter procedido, no prazo legal, ao seu levantamento no estabelecimento postal (cfr. art. 229.º, n.º 4, do nCPC).

A aplicação do n.º 4 do art. 191.º do nCPC à notificação do requerido, a que alude o artigo 12.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98 só poderia basear-se num argumento de identidade de razões. No entanto, esta identidade não existe na situação em apreço, pois que, no caso de, no procedimento de injunção, se frustrar a notificação por via postal registada, realiza-se a notificação por via postal simples com prova de depósito (art. 12.º, n.º 4 e 5, do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98).

Dito de outro modo: a aplicação do disposto no n.º 4 do art. 191.º do nCPC só seria pensável se a notificação do requerido seguisse o regime da citação do réu. Não é isso, todavia, que sucede: no caso de se frustrar a notificação por carta registada com aviso de receção, há que observar o disposto no art. 12.º, n.º 4 e 5, do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98. Assim, há que concluir que a falta do cumprimento do estabelecido em qualquer destes preceitos gera, automaticamente, a nulidade da notificação do requerido.

Por consequência, o juiz, face à preterição de alguma das formalidades legais previstas no art. 12.º do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, deve julgar procedente a nulidade da notificação, mesmo que o requerido, em embargos deduzidos à execução, não tenha cumprido o ónus da prova do prejuízo resultante dessa preterição para a sua defesa.

José Henrique Delgado de Carvalho
(Juiz de Direito)