"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



30/12/2014

Jurisprudência constitucional (21)


Constituição de enfiteuse

-- TC 12/11/2014 (786/2014)

"Julga inconstitucionais as normas constantes das alíneas a) e b) do n.º 5 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, na redação dada pela Lei n.º 108/97, de 16 de setembro, na medida em que aí se estabelece um regime de constituição de enfiteuse por usucapião, o qual, conjugado com o regime de consolidação dos domínios útil e direto decorrente da abolição da figura, opera a translação da propriedade plena, sem atribuição, em termos gerais, de indemnização".

Nota: o acórdão contém um voto de vencido, acompanhado de uma relevante declaração. 

Legislação (10)


-- L 82/2014, de 30/12: Procede à trigésima quarta alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, e altera ainda o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966

29/12/2014

Bibliografia (52)



-- Andrade Pissarra, N., O incidente de comunicabilidade de dívidas conjugais, Dir. 146 (2014), 737 

-- Bonifácio Ramos, J. L., O sistema misto de valoração da prova, Dir 146 (2014), 555

22/12/2014

Jurisprudência uniformizada (11)


Resolução em benefício da massa insolvente; má fé de terceiro


«Nos termos e para os efeitos dos artigos 120.º, n.º 4 e 49.º, n.ºs 1 e 2, alíneas c) e d) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, presume-se que age de má fé a sociedade anónima que adquire bens a sociedade por quotas declarada insolvente, sendo de considerar o sócio-gerente desta e seu filho, interveniente no negócio de aquisição como representante daquela, pessoas especialmente relacionadas com a insolvente.»

Bibliografia (51)


-- Hodges, C./Stadler, A., Resolving Mass Disputes / ADR and Settlement of Mass Claims (Edward Elgar Pub.: Cheltenham/Northampton 2013)

-- Rauscher, Th. (Ed.), Europäisches Zivilprozess- und Kollisionsrecht EuZPR/EuIPR, Band II / EG-VollstrTitelVO, EG-MahnVO, EG-BagatellVO, EU-KPfVO, HProrogÜbk 2005, EG-ZustVO 2007, EG-BewVO, EG-InsVO (Sellier: München 2015)

-- Stürner, M./Gascón Inchausti, F./Caponi, R., The Role of Consumer ADR in the Administration of Justice / New Trends in Access to Justice under EU Directive 2013/11 (Sellier: München 2014)

19/12/2014

Jurisprudência constitucional (20)



Impugnação da decisão sobre o pedido de protecção jurídica

TC 10/12/2014 (853/2014) decidiu:

"Julgar inconstitucional a norma constante do artigo 27.º, n.º 2 da Lei n.º 34/2004 de 29 de julho, na medida em que exclui em absoluto a produção de prova testemunhal [...]".



Jurisprudência (54)



Reclamação para a conferência contra a não admissão do recurso; taxa de justiça

I. O sumário de RL 27/11/2014 (18332/11.0YYLSB-B.L1-2) é o seguinte:

"1 - Na reclamação para conferência da decisão do Relator que ordenou o desentranhamento do anterior requerimento no qual, por sua vez, pretendia-se que fosse proferido acórdão sobre o despacho do mesmo que indeferiu a reclamação deduzida na 1ª instância, nos termos do artº 688º do CPC, é devida taxa de justiça pelo respectivo impulso processual.

2 - Isto porque, se a parte discorda do despacho do relator e chama a conferência para proferir acórdão sobre a matéria, encaminha o processo para uma intercorrência processual secundária, configurável como eventual em relação à própria reclamação, pelo que estamos perante novo incidente. 

3 - A taxa de justiça que é paga aquando a interposição do recurso não abrange qualquer vicissitude processual posterior até à decisão final do tribunal de recurso.  

4 - Como incidente com tal natureza é tributado pelo seu impulso, ao abrigo dos artºs 6.º e 7.º, nº 4, do RCP, cuja oportunidade de pagamento é até ao momento da prática do acto (artº 14.º do mesmo diploma, 150.º-A do CPC, ora 145.º)".

II. Para melhor compreender o decidido, transcreve-se a seguinte parte da fundamentação do acórdão:

"Nesta oportunidade não está em discussão se pela dedução de reclamação nos termos do artº 688.º do CPC, ou do art.º 643.º do novo regime, é devida, ou não, taxa de justiça pelo respectivo impulso processual.

Está em causa, sim, saber se pelo requerimento em que se discordou da decisão do relator proferida, ao abrigo do artº 688º., n.º 4, do CPC e se pretendeu que sobre a matéria da mesma recaísse acórdão, segundo o artº 700.º, n.º 3 do CPC, com a sua apresentação era devida taxa de justiça, razão pela qual deveria ter sido logo liquidada e paga sem a necessidade da secção diligenciar nos termos do artº 685.º-D do CPC.

De qualquer modo, essa primeira reclamação é um incidente cuja decisão final pode importar a atribuição da responsabilidade pelas respectivas custas, inclusivamente a taxa sancionatória excepcional, segundo os termos conjugados dos artºs 447.º-B do CPC, ora 531.º, e 10.º do RCP (Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 3ª ed, 2010, 184).  

É ao relator que compete decidi-la (artº 688.º, n.º 4, do CPC) e fica definitivamente resolvida a questão se não houver oportuna reclamação para a conferência.

Se a parte discorda do despacho do relator e chama a conferência para proferir acórdão sobre a matéria então encaminha o processo para uma intercorrência processual secundária, configurável como eventual em relação à própria reclamação, pelo que estamos perante novo incidente.

É, pois, errado pensar que a taxa de justiça que devia ser paga aquando a interposição do recurso abrange qualquer vicissitude processual posterior até à decisão final do tribunal de recurso.

Como incidente com tal natureza é tributado pelo seu impulso, ao abrigo dos artºs 6.º e 7.º, n.º 4, do RCP, cuja oportunidade de pagamento é até ao momento da prática do acto (artº 14.º do mesmo diploma, 150.º-A do CPC, ora 145.º).

E não faz sentido referir que apenas haveria que efectuar a sua imputação na “conta de custas final”, mesmo que fosse devida taxa de justiça e não se a liquidasse e pagasse, inclusivamente depois de se ser notificado para o fazer conjuntamente com o pagamento da penalidade processual, excluindo-se, assim, a determinação de desentranhamento da peça processual.

Outra não pode ser a solução face aos termos muito claros como as disposições processuais cominam essas omissões.

Precisamente, o artº 150.º-A, nº 3 do CPC, ora 145.º, dispõe que “… a falta de junção do documento referido no n.º 1 não implica a recusa da peça processual, devendo a parte proceder à sua junção nos dez dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos artigos 486.º-A, 512.º-B e 685.º-D” (ora 570.º e 642.º).

As cominações finais previstas nesses artigos são os desentranhamentos das peças processuais que lhes respeitam (artºs 486.º-A, n.º 6, do CPC, ora 570.º, n.º 6, 685.º-D, n.º 2, ora 643.º, n.º 2).

Daí se diga que a final se deva confirmar a decisão do relator, sem que se constate nas normas transactas qualquer inconstitucionalidade se interpretadas como foram, designadamente quanto aos preceitos citados pelo requerente sem que se exponha a razão de ser da sua eventual violação, para tanto não bastando referir que seria “uma violação do direito de contraditório e princípio de igualdade de armas, previsto processualmente e dignificado constitucionalmente, enquanto garantia das partes e corolário de confiança e segurança jurídica”."

 

Legislação (9)


  • -- L 79/2014, de 19/12: Revê o regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil e procedendo à segunda alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, à terceira alteração aoDecreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 158/2006, de 8 de agosto;
  • -- L 80/2014, de 19/12: Estabelece o regime de renda condicionada dos contratos de arrendamento para fim habitacional;
  • -- L 81/2014, de 19/12: Estabelece o novo regime do arrendamento apoiado para habitação e revoga a Lei n.º 21/2009, de 20 de maio, e os Decretos-Leis n.os 608/73, de 14 de novembro, e 166/93, de 7 de maio.

18/12/2014

Informação (29)


-- Aviso14184/2014, de 18/12 (Projeto de Código Deontológico dos Solicitadores e dos Agentes de Execução), DR, 2.ª série, de 18/12/2014

16/12/2014

Legislação europeia (Processo Civil Europeu) (6)


-- Regulamento de Execução (UE) n.° 1329/2014 da Comissão, de 9 de dezembro de 2014, que estabelece os formulários referidos no Regulamento (UE) n.° 650/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à competência, à lei aplicável, ao reconhecimento e execução das decisões, e à aceitação e execução dos atos autênticos em matéria de sucessões e à criação de um Certificado Sucessório Europeu (JO L 359, de 16/12/2014)






15/12/2014

Jurisprudência constitucional (19)




Aplicação no tempo do nCPC: títulos executivos forever? (5)


1. TC 3/12/2014 (847/2014) decidiu:

“Julgar inconstitucional a norma resultante dos artigos 703.º do CPC e 6.º, n.º 3 da Lei n.º 41/2013 de 26 de julho, na interpretação de que aquele artigo 703.º se aplica a documentos particulares emitidos em data anterior à da entrada em vigor do novo CPC e então exequíveis por força do artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do CPC de 1961 […].

Não é a primeira vez que a jurisprudência considera inconstitucional a aplicação imediata no novo regime dos títulos executivos a documentos anteriores à entrada em vigor do nCPC (cf. RE 27/2/2014 (374/13.3TUEVR.E1) e RE 26/3/2014 (766/13.8TTALM.L1-4); sobre o problema clicar aqui, aqui e aqui). É, no entanto, a primeira vez que o TC se pronuncia sobre a matéria.


2. A formulação de um juízo sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da aplicação imediata do elenco dos títulos executivos implica uma ponderação entre o que uma parte (o credor) perde com a desqualificação de um documento como título executivo e o que a outra parte (o devedor) ganha com essa desqualificação. Como é evidente, o credor perde a possibilidade de instaurar uma execução e o devedor liberta-se da sujeição à execução.

Neste quadro, seria de esperar que o acórdão tivesse ponderado estes dois interesses contrapostos, vindo a concluir – atendendo à declaração de inconstitucionalidade que profere – pela prevalência do interesse do credor sobre o interesse do devedor. A verdade é que não foi este o iter decisório do acórdão.

O acórdão não deixa de referir os interesses do devedor. Pronunciando-se sobre a justificação que acompanha a Proposta de Lei n.º 113/XII, o acórdão refere o seguinte:

“A medida legislativa em apreciação tem […] a virtualidade de libertar o executado da necessidade de se defender de atos de agressão da sua esfera patrimonial diante de execuções abusivamente instauradas, o que, sem prejuízo, do direito do exequente a instaurar execução com base no título executivo de que dispõe, também constitui direito merecedor de protecção à luz da Constituição”.

No entanto, com o fundamento de que “a questão de constitucionalidade que é suscitada não reside na limitação do elenco dos títulos executivos”, mas “na aplicação do novo elenco legal dos títulos executivos aos documentos constituídos no passado”, o acórdão acaba por concluir que “é […] no confronto entre o interesse público em evitar execuções injustas e o interesse particular em manter a força executiva do documento que titula o crédito que se joga a apreciação da proporcionalidade da solução encontrada”. Isto é: em vez de analisar o problema pela perspectiva de uma ponderação de interesses privados contraditórios, o acórdão prefere contrapor o interesse privado do credor em manter a possibilidade da execução ao interesse público em evitar execuções injustas. Neste enquadramento, o acórdão acaba por concluir que, como o regime processual civil contém várias soluções adequadas para combater a execução injusta, nada pode obstar ao sacrifício do devedor decorrente da “sobrevigência” do título executivo.

3. Não se pode acompanhar esta orientação do TC. Como seria de esperar, o processo civil português fornece soluções adequadas para frustrar uma execução injusta. O problema é, no entanto, o de saber se é exigível que o executado tenha de recorrer a essas soluções para obstar a uma execução injusta. Mais em concreto: o que se pode questionar é se se pode fundamentar a “sobrevigência” de um título executivo com o argumento de que, se execução for injusta, há soluções para obviar a essa execução.

Como se disse, a oposição que o acórdão devia ter ponderado não é aquela que se verifica entre o interesse privado do exequente em manter o título executivo e o interesse público na frustração das execuções injustas, mas aquela que existe entre o interesse privado do credor em poder recorrer à execução e o interesse do devedor em não ficar sujeito à execução. Repita-se: o que há a ponderar é o interesse do credor em usar a execução e o interesse do devedor em não estar sujeito a essa execução, não o interesse do credor em recorrer à execução e a possibilidade de o devedor frustrar a execução no caso de ela ser injusta. A utilização desta possibilidade para justificar a “sobrevigência” do título executivo traduz-se – é bom afirmá-lo – numa subordinação completa e irrestrita dos interesses do devedor aos interesses do credor.

Em contrapartida, visto o problema pela perspectiva dos interesses conflituantes do credor e do devedor -- que parece ser a única em que se pode situar a apreciação da questão –, parece difícil sustentar a inconstitucionalidade da aplicação imediata do novo elenco dos títulos executivos, dado que, até pelo princípio da igualdade (cf. art. 13.º CRP), a “sobrevigência” do título executivo não pode sobrepor-se à libertação do devedor da sujeição a uma execução.

É precisamente esta igualdade constitucional dos interesses do credor e do devedor (aliás, seria constitucional qualquer outra solução?) que assegura a constitucionalidade de qualquer opção do legislador ordinário. É por isso que tanto é constitucional aplicar – como, aliás, já aconteceu no passado – um novo elenco dos títulos executivos a documentos anteriores, como é constitucional aplicar uma restrição do elenco desses títulos a documentos constituídos anteriormente.

MTS

Bibliografia (50)


-- Lazic, V., Procedural Justice for ‘Weaker Parties’ in Cross-Border Litigation under the EU Regulatory Scheme, Utrecht L. Rev. 10/4 (2014), 100

12/12/2014

Bibliografia (49)


-- Riesenhuber, K. (Ed.), Europäische Methodenlehre / Handbuch für Ausbildung und Praxis (De Gruyter: Berlin 2014) 

-- Secretariado–Geral do Conselho (Ed.), Direito Civil – Cooperação Judiciária Europeia (União Europeia 2013) (download em formato ePub)

11/12/2014

Jurisprudência (53)


Contrato de arrendamento; título executivo

-- O sumário de STJ 26/11/2014 (1442/12.4TCLRS-B.L1.S1) é o seguinte:

"I - O art. 15.º, n.º 2, do NRAU, conjugado com o art. 46.º, n.º 1, al. d), do CPC, confere força executiva ao contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante das rendas em dívida. 

II - A comunicação ao arrendatário, a que alude o art. 15.º, n.º 2, do NRAU, funciona como requisito complementar de exequibilidade do título.

III - O título executivo referido em I, tendo natureza complexa, integra dois elementos: (i) o contrato onde a obrigação foi constituída; (ii) a demonstração da realização da comunicação ao arrendatário da liquidação do valor das rendas em dívida.

IV - A identidade do obrigado pelo título resulta do próprio contrato de arrendamento e abrange quem nele se obrigou, perante o senhorio, ao pagamento das rendas em dívida.

V - Não obstante o art. 15.º, n.º 2, do NRAU apenas fazer referência à comunicação ao arrendatário, a mesma – por identidade de razões e enquanto condição de exequibilidade do título – deve ser feita também aos fiadores. 

VI - Constitui título executivo, tanto em relação ao arrendatário como em relação aos fiadores, o contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo da comunicação referida em V."

Jurisprudência constitucional (18)


Custas processuais; princípio da proporcionalidade

-- TC 3/12/2014 (844/2014) decidiu:
 
"Julgar inconstitucional, por violação dos princípios do acesso ao direito e da proporcionalidade, consagrados, respetivamente, nos artigos 20.º e 2.º, da Constituição, a norma constante do artigo 13.º, n.º 1 e Tabela Anexa ao Código das Custas Processuais, na versão do Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro, na medida em que dela decorrem custas sem conexão com a complexidade do processo, não se estabelecendo um limite para o valor da ação a considerar para efeitos do cálculo da taxa de justiça [...]."

Nota: o sumário de TC 15/7/2013 (421/2013) é o seguinte:
 
"Julga inconstitucionais as normas contidas nos artigos 6.º e 11.º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o caráter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título."


10/12/2014

Jurisprudência constitucional (17)



Inconstitucionalidade dos fundamentos da oposição à execução baseada em injunção

1. O TC 28/10/2014 (714/2014) julgou inconstitucional o art. 857.º, n.º 1, CPC, aprovado pela L 41/2013, de 26/6, quando interpretado no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória. Isto significa que, apesar da diferença entre os preceitos, o TC continua a fazer o mesmo juízo de inconstitucionalidade que fez quanto ao disposto no art. 814.º CPC/61 (cf. TC 9/7/2013 (388/2013)).

2. Antes de fazer uma breve apreciação do acórdão, convém recordar que, na ordem jurídica portuguesa, vigora, além do regime relativo à injunção "interna", o regime respeitante à injunção de pagamento europeia (instituída pelo Reg. 1896/2006). Tem interesse lembrar, em traços muito largos, o regime desta injunção:

-- Se estiverem preenchidos os requisitos legais, o tribunal emite uma injunção de pagamento europeia no prazo mais curto possível e, regra geral, no prazo de 30 dias a contar da apresentação do requerimento (art. 12.º, n.º 1, § 1.º, Reg. 1896/2006);

-- O requerido é avisado de que pode optar entre pagar ao requerente o montante indicado na injunção emitida ou deduzir oposição mediante a apresentação de uma declaração de oposição no prazo de 30 dias a contar da citação ou notificação da injunção (art. 12.º, n.º 3, Reg. 1896/2006);

-- O requerido pode apresentar uma declaração de oposição à injunção de pagamento europeia junto do tribunal de origem (art. 16.º, n.º 1, Reg. 1896/2006);

-- Se for apresentada declaração de oposição, a acção prossegue nos tribunais competentes do Estado de origem, de acordo com as normas do processo civil comum, a menos que o requerente tenha expressamente solicitado que, nesse caso, se ponha termo ao procedimento (art. 17.º, n.º 1, § 1.º, Reg. 1896/2006); 

-- Se não for apresentada uma declaração de oposição do requerido, o tribunal de origem declara imediatamente executória a injunção de pagamento europeia (art. 18.º, n.º 1 1.ª parte, Reg. 1896/2006);

-- Após o termo do prazo fixado para a apresentação da oposição, o requerido revel tem o direito de pedir a reapreciação da injunção de pagamento europeia ao tribunal competente do Estado de origem (cf. art. 20.º Reg. 1896/2006); em concreto: 

-- O requerido tem o direito de requerer ao tribunal competente a reapreciação da injunção de pagamento europeia se esta tiver sido citada ou notificada por um dos meios que não prove a sua recepção pelo requerido e se essa citação ou notificação não tiver sido feita a tempo de permitir a esse requerido preparar a sua defesa, sem que tal facto lhe possa ser imputável (art. 20.º, n.º 1, al. a), Reg. 1896/2006);

-- O requerido pode solicitar a reapreciação da injunção de pagamento europeia se, qualquer que tenha sido a modalidade da sua citação, tiver sido impedido de contestar o crédito por motivo de força maior ou devido a circunstâncias excepcionais, sem que tal facto lhe possa ser imputável (art. 20.º, n.º 1, al. b), Reg. 1896/2006).

A descrição sumária do regime da injunção de pagamento europeia é especialmente interessante, porque esse regime consagra apenas dois possíveis fundamentos de oposição à injunção por um requerido revel: a irregularidade e intempestividade da sua citação; a verificação de um caso de força maior ou de uma circunstância excepcional que tenha obstado à sua oposição.

3. Uma leitura possível do acórdão – e perfeitamente legítima em face da sua parte dispositiva – é a de que o TC entende que qualquer restrição aos fundamentos de oposição à execução baseada em injunção é, na ordem jurídica portuguesa, inconstitucional. Não é algo que o TC não possa entender. Só que então teria que concluir que o regime de oposição do requerido revel que consta do art. 20.º, n.º 1, Reg. 1856/2006 é igualmente inconstitucional. Também não é algo que o TC não possa entender. Mas há que convir que seria uma enorme surpresa se um regime que tem convivido sem problemas quer na ordem jurídica europeia, quer igualmente – ao que se julga – nas ordens internas de outros 27 Estados-membros fosse considerado inconstitucional em Portugal.

4. Atendendo à respectiva fundamentação e, em especial, ao que é afirmado no ponto 8.1., o acórdão permite, no entanto, uma outra interpretação: a de que, ao invés de considerar inconstitucional qualquer restrição aos fundamentos de oposição à execução baseada em injunção, o TC apenas considera inconstitucional essa restrição enquanto se mantiver a diferença entre a citação do réu no processo declarativo (cf. art. 219.º CPC) e a notificação do requerido no procedimento de injunção (cf. art. 12.º e 12.º-A RPOP).

Se o acórdão for entendido (ou se puder ser entendido) nesta perspectiva restritiva, então o mesmo nada tem de criticável. É compreensível que a formação de um título executivo com uma força executória semelhante à da sentença tenha que ter uma formação com idênticas garantias àquelas que são exigidas quanto a esta última.

5. Importa, por fim, dar a conhecer o seguinte: do pacote legislativo entregue em 15/12/2011 pela Comissão de Revisão do Processo Civil constava uma reformulação do regime da oposição à execução baseada em injunção (aliás, em termos ainda mais restritivos do que aqueles que se encontram no actual art. 857.º CPC), mas também constava uma proposta de reformulação do RPOP na qual se propunha uma aproximação da notificação do requerido ao regime da citação do réu e, à semelhança do disposto no art. 12.º, n.º 3, Reg. 1896/2006, se enumeravam as informações a transmitir ao requerido. Por razões que não são conhecidas, nos trabalhos posteriores não foi dado seguimento a esta última proposta.


MTS