"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



31/05/2016

Legislação europeia (Projectos e propostas) (19)


-- Interim Report on the draft Council decision on the ratification and accession by Member States, in the interest of the European Union, to the Protocol of 2010 to the International Convention on Liability and Compensation for Damage in Connection with the Carriage of Hazardous and Noxious Substances by Sea, with the exception of the aspects related to judicial cooperation in civil matters (13806/2015 – C8-0410/2015 – 2015/0135(NLE))

-- Draft Report with recommendations to the Commission on cross-border aspects of adoptions (2015/2086(INL)



Jurisprudência (361)




Título executivo; documento particular; 
aplicação da lei no tempo


1. O sumário de RL 10/3/2016 (22/14T8AGH-2.L1-2) é o seguinte:

I – Não é inequívoca a intenção do legislador, na Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, de revogar a norma do artigo 9º, n.º 4, do Decreto-Lei 287/93, de 20 de Agosto.

II – Ainda que o fosse, o documento particular titulador de contrato de mútuo celebrado entre o Banco e um particular, ainda no domínio de vigência do artigo 46º, n.º 1, alínea c), do anterior Código de Processo Civil, sempre conservaria a conferida qualidade de título executivo.

III - Existindo já à data da prolação do despacho de “indeferimento liminar” do requerimento executivo, jurisprudência e doutrina no sentido da sobrevigência do referenciado artigo 9º, n.º 4, e da inconstitucionalidade do artigo 703º, n.º 1, enquanto interpretado no sentido de, conjugado com o artigo 6º, n.º 3, ambos do novo Código de Processo Civil, recusar a qualidade de título executivo aos documentos particulares emitidos em data anterior à entrada em vigor daquele, e então exequíveis por força do artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil de 1961, não é manifesta a falta de título executivo a que se refere o artigo 726º, n.º 2, alínea a), do novo Código de Processo Civil.

2. O art. 1.º, n.º 1, DL 287/93, de 20/8, transforma a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e o seu art. 9.º, n.º 4, estabelece o seguinte: "Os documentos que, titulando acto ou contrato realizado pela Caixa, prevejam a existência de uma obrigação de que a Caixa seja credora e estejam assinados pelo devedor revestem-se de força executiva, sem necessidade de outras formalidades".

MTS




30/05/2016

Legislação europeia (Projectos e propostas) (18)


-- Proposta de REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO que substitui as listas dos processos de insolvência e dos administradores da insolvência constantes dos anexos A e B do Regulamento (UE) 2015/848 relativo aos processos de insolvência (COM(2016) 317 final, de 30/5/2016



Bibliografia (349)


-- Ruggeri, L.-Minervini, E., Contratti transattivi e negozi di accertamento (Edizioni Scientifiche Italiane: Napoli 2016)




Jurisprudência (360)




Apelação; impugnação da matéria de facto;
ónus do recorrente


1. O sumário de STJ 3/3/2016 (1190/10.0TBFLG.P1.S1) é o seguinte:
 

I - A reforma do Código de Processo Civil de 2013 não pretendeu alterar o sistema dos recursos cíveis, mas teve a preocupação de conferir maior eficácia à segunda instância para o exame da matéria de facto através do reforço e ampliação dos poderes da Relação, sem que, porém, tenha trazido consigo a eliminação ou, sequer, a atenuação do ónus de delimitação e fundamentação do recurso, introduzidos em 1995 – art. 640.º, n.º 1, do NCPC (2013).

II - Embora o NCPC tenha deixado de exigir a formulação de quesitos da base instrutória, antes prevendo a enunciação de temas de prova, quanto ao julgamento de facto continua a determinar que o tribunal dê como provados ou não provados os factos relevantes para a decisão – art. 607.º, n.º 4, do NCPC.

III - Não se tendo o recorrente limitado, nas alegações apresentadas, a afirmar que o acidente ocorreu de forma diferente ou a dar uma nova versão genérica da matéria de facto, antes tendo feito afirmações concretas sobre como se desenrolaram os factos, em contradição com o conteúdo das respostas aos quesitos, mostra-se suficientemente cumprido o ónus previsto no art. 640.º, n.º 1, al. c), do NCPC que sobre si recaía.

IV - Em consequência, resultando das alegações qual a decisão que devia ter sido tomada relativamente aos diversos factos da causa, o recurso relativo à impugnação da decisão da matéria de facto não devia ter sido rejeitado.
 

2. Tem interesse conhecer esta parte da fundamentação do acórdão:
 

"[...] O Supremo Tribunal de Justiça tem sido repetidamente chamado a verificar se, ao impugnarem a decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto, os apelantes, cumpriram ou não as exigências feitas pela lei de processo como condição de conhecimento de tal impugnação; exigências essas decorrentes da necessidade de definição do objecto e de fundamentação do recurso, conformes com o modelo de impugnação da matéria de facto acolhido na lei portuguesa.

Recorda-se, assim, o que se escreveu já várias vezes e, por último, no acórdão de 1 de Outubro de 2015, www.dgsi.pt, proc. nº 6626/09.0TVLSB.L1.S1:

«7. O Supremo Tribunal de Justiça já tratou inúmeras vezes da questão central deste recurso [tratava-se então de saber se a recorrente cumprira ou não os ónus definidos pelos nºs 1 e 2 do artigo 640º do Código de Processo Civil, quando impugnou parte significativa da decisão sobre a matéria de facto, no recurso de apelação]. No recente acórdão de 9 de Julho de 2015,www.dgsi.pt, proc. nº 405/09.1TMCBR.C1.S1, escreveu-se o seguinte, que aqui se reitera e, por comodidade, se transcreve:«Como este Supremo Tribunal tem repetidamente recordado (cfr. por exemplo o acórdão de 4 de Novembro de 2010,www.dgsi.pt, proc. nº 7006.05.1TBBRG.G1.S1 e jurisprudência nele citada, e ainda os acórdãos de 29 de Novembro de 2011,www.dgsi.pt, proc. nº 39/2002.E1.S1 ou de 30 de Junho de 2011, www.dgsi.pt, proc. 6450/05.9TBSXL.L1.S1), a impugnação da decisão de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em primeira instância, ainda que apenas se pretenda discutir parte da decisão.

Como se diz no preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/95 (…), “a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto,nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso.

Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido.”

Nesse sentido, impôs-se ao recorrente um “especial ónus de alegação”, no que respeita “à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação”, em decorrência “dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa fé processuais, assegurando, em última análise, a seriedade do próprio recurso intentado e obviando a que o alargamento dos poderes cognitivos das relações (resultante da nova redacção do artigo 712º [actual 662º]) – e a consequente ampliação das possibilidades de impugnação das decisões proferidas em 1ª instância – possa ser utilizado para fins puramente dilatórios, visando apenas o protelamento do trânsito e julgado de uma decisão inquestionavelmente correcta.

Daí que se estabeleça”, continua o mesmo preâmbulo, “no [então] artigo 690º-A, que o recorrente deve, sob pena de rejeição do recurso, além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, impunham diversa decisão sobre a matéria de facto. Tal ónus acrescido do recorrente justifica, por outro lado, o possível alargamento do prazo para elaboração e apresentação das alegações, consentido pelo nº 6 do [então] artigo 705”

O ónus especificamente criado foi pois justificado pela necessidade de impor ao recorrente uma “delimitação do objecto do recurso” e uma “fundamentação”, repete-se, tendo em conta o âmbito possível do recurso da decisão de facto, tal como foi concebido (cfr. acórdãos de 9 de Outubro de 2008, www.dgsi.pt, proc. nº 07B3011, ou de 18 de Junho de 2009, www.dgsi.pt, proc. nº 08B2998).

O artigo 690º- A do Código de Processo Civil foi posteriormente alterado pelo Decreto-Lei nº 183/2000, de 10 de Agosto. Continuou a incumbir ao recorrente que pretenda impugnar a decisão de facto proferida em primeira instância, para o que agora releva, “especificar (…) os concretos pontos de facto que [o recorrente] considera incorrectamente julgados” e “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”. Mas, se “os meios probatórios invocados como fundamento de erro na apreciação das provas [tiverem] sido gravados”, passou a caber-lhe, “sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 522ºC”.

O artigo 690º-A veio a ser revogado pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, que em sua substituição acrescentou ao Código o artigo 685º-B, mantendo os ónus referidos (indicação dos concretos pontos de facto incorrectamente julgados e dos concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que implicassem decisão diversa da proferida, se for possível, “indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição”.

A reforma do Código de Processo Civil de 2013 não pretendeu alterar o sistema dos recursos cíveis, aliás modificado significativamente pouco tempo antes, pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto; mas teve a preocupação de “conferir maior eficácia à segunda instância para o exame da matéria de facto”, como se pode ler na Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 113/XII apresentada à Assembleia da República, de cuja aprovação veio a resultar o actual Código de Processo Civil, disponível em www.parlamento.pt .

Essa maior eficácia traduziu-se no reforço e ampliação dos poderes da Relação, no que toca ao julgamento do recurso da decisão de facto; mas não trouxe consigo a eliminação ou, sequer, a atenuação do ónus de delimitação e fundamentação do recurso, introduzidos em 1995. Com efeito, o nº 1 do artigo 640º vigente, aplicável ao recurso de apelação que agora nos interessa:

– manteve a indicação obrigatória “dos concretos pontos de facto” que o recorrente “considera incorrectamente julgados” (al. a),

– manteve o ónus da especificação dos “concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos de facto impugnados diversa da recorrida” (al. b),

– e veio exigir ao recorrente que especificasse “a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” (al. c), sob pena de rejeição do recurso de facto.

E à mesma rejeição imediata conduz a falta de indicação exacta “das passagens da gravação em que se funda” o recurso, se for o caso, sem prejuízo de poder optar pela apresentação da “transcrição dos excertos” relevantes.

Cumpridos os requisitos assim definidos para a delimitação e fundamentação da impugnação da decisão de facto, então caberá à Relação julgar o recurso, dispondo para o efeitos dos poderes reforçados do actual artigo 662º (correspondente ao anterior artigo 712º, com alterações).»"


3. O acórdão procede a uma análise aprofundada do ónus que recai sobre o recorrente que impugna a matéria de facto e toma a única orientação que é compatível com a letra e o espírito do regime legal estabelecido no art. 640.º, n.º 1, al. c), CPC. Se é certo que não basta que o recorrente se limite a afirmar que discorda da decisão proferida pela 1.ª instância, também é verdade que tem de se considerar que esse ónus se encontra devidamente cumprido se das alegações desse recorrente resultar o sentido em que, em sua opinião e em função da prova produzida, a matéria de facto impugnada deveria ter sido julgada pela 1.ª instância.

Saber se, num caso concreto, este critério se encontra preenchido é algo que deve ser feito com ponderação e razoabilidade, mas sempre sem exigir ao recorrente "formas únicas", dado que estas são incompatíveis com os actuais parâmetros do processo civil português. Estes mesmos parâmetros conduzem a que o tribunal deva partir do princípio de que as partes cumprem os ónus que lhes são impostos pelo CPC. Quaisquer dúvidas sobre as posições das partes devem ser resolvidas pelo tribunal através do seu dever de esclarecimento (cf. art. 7.º, n.º 2, CPC). 

MTS


27/05/2016

Legislação europeia (Projectos e propostas) (17)


-- Proposal for a REGULATION OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL on cooperation between national authorities responsible for the enforcement of consumer protection laws (Text with EEA relevance) (COM(2016) 283 final, de 25/5/2016)



Paper (204)



-- Frankenreiter, J., Are Advocates General Political? Policy Preferences of EU Member State Governments and the Voting Behavior of Members of the European Court of Justice (05.2016)
 
 



Jurisprudência (359)



Processo executivo; legitimidade;
caso julgado; âmbito subjectivo



I. O sumário de RG 28/1/2016 (54/14.2TBPCR-B.G1) é o seguinte:

1) Na ação executiva a questão da legitimidade resolve-se no confronto entre as partes e o título executivo: têm legitimidade como exequente e executado, respetivamente, quem no título figura como credor e como devedor.

2) Uma sentença que condene um condomínio a pagar uma determinada quantia a um credor, vale como título executivo contra todos os condóminos.

3) No caso de o título executivo ser um cheque, os executados serão apenas os obrigados cambiários.
 


II. Tem interesse conhecer esta parte da fundamentação do acórdão: 

"O título executivo é um pressuposto da ação executiva na medida em que confere ao direito à prestação invocada um grau de certeza e exigibilidade que a lei reputa de suficientes para a admissibilidade de tal ação.
 
Na verdade «…a relevância especial dos títulos executivos que resulta da lei deriva da segurança, tida por suficiente, da existência do direito substantivo cuja reparação se pretende efetivar por via da ação executiva.
 
O fundamento substantivo da ação executiva
[…] é a própria obrigação exequenda, sendo que o título executivo é o seu instrumento documental legal de demonstração, ou seja, constitui a condição daquela ação e a prova legal da existência do direito de crédito nas suas vertentes fáctico-jurídicas» - Ac. do STJ de 18.10.2007, www.dgsi.pt, p.07B3616.
 
Sendo certo que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são suportadas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações, salvo disposição em contrário, conforme se estabelece no artigo 1424º nº 1 do Código Civil, para que possa executar-se tal obrigação, torna-se necessário que haja um título de onde resulte tal obrigação.
 
Refere a apelante que a doutrina e a jurisprudência têm entendido que a sentença proferida contra um condomínio vincula os condóminos podendo ser executada contra estes, entendendo ainda que o mesmo vale para as execuções baseadas em títulos de crédito, nomeadamente cheques, mesmo como meros quirógrafos, como é o caso dos presentes autos.
 
Sucede, porém, que o título executivo em causa nestes autos não é uma sentença mas, antes, os cheques cujas cópias constam de fls. 26 a 27, e dos mesmos resulta que o sacador e obrigado é, apenas, o Condomínio do Dr. JGM e, como acima se referiu, é o título executivo que determina o fim e os limites da ação executiva.
 
E, no caso de um cheque (título de crédito), que serve de título executivo, não é a relação subjacente que fundamenta, diretamente, a execução, para efeitos de se determinar a legitimidade das partes, embora, em determinadas circunstâncias se possa discutir a referida relação subjacente.
 
Como refere o Dr. Lebre de Freitas, ib
idem [A Ação Executiva, 2.ª ed,], páginas 103 e seg., “a legitimidade das partes determina-se na ação executiva, com muito maior simplicidade do que na ação declarativa.
 
Enquanto nesta há que indagar da posição das partes, em face da pretensão, o que implica averiguar a titularidade real, ou meramente afirmada pelo autor, da relação ou outra situação jurídica material em que ela se funda e dá por vezes lugar a dificuldades de distinção perante a questão de mérito, na ação executiva a indagação a fazer resolve-se no confronto entre as partes e o título executivo: têm legitimidade como exequente e executado, respetivamente, quem no título figura como credor e como devedor.”
 
Não se pode, assim, pretender que uma sentença condenatória que condene um condomínio a pagar uma determinada quantia a um credor, seja equiparável à situação de um cheque cuja sacador e obrigado é um condomínio e que serve de base a uma execução, uma vez que naquela situação, a sentença proferida contra o condomínio vincula os condóminos, podendo ser executada contra estes, isto é, a sentença que condene o condomínio a pagar determinada quantia vale, enquanto título executivo, contra todos os condóminos (cfr., neste mesmo sentido, o Acórdão da Relação de Coimbra de 15/10/2013, relatado pelo Desembargador José Avelino Gonçalves, in www.dgsi.pt), enquanto no caso de o título executivo ser um cheque, os executados serão apenas os obrigados cambiários.
 
Já no que se refere ao título executivo cheque, o executado tem de ser a pessoa que no título figura como obrigado, isto é, no caso dos autos, o sacador do cheque, independentemente de a obrigação subjacente, poder vincular outrem – sendo certo que podem ainda ser demandados outros obrigados cambiários que, no título estejam juridicamente sujeitos a tal posição, como poderá suceder com os endossantes."


III. O decidido no acórdão não suscita quaisquer dúvidas: se os títulos executivos são cheques, apenas os respectivos devedores cambiários podem ser demandados.

Interessante é a referência de que a sentença condenatória de um condomínio vincula todos os condóminos. Tal como se refere em RC 15/10/2013 (379/03.2TBOFR.C1), "a personalidade judiciária atribuída ao condomínio é meramente formal já que os condóminos é que são “partes” na causa, embora debaixo da “capa” do condomínio representado em juízo pelo administrador.". Efectivamente, o condomínio não é uma entidade dotada de personalidade jurídica, pelo que nada, no plano substantivo, pode vincular o condomínio. Assim, para efeitos substantivos, há que "desconsiderar" a personalidade judiciária do condomínio e "considerar" a personalidade jurídica dos condóminos.

MTS


26/05/2016

Jurisprudência europeia (TJ) (96)


Reg. 2201/2003 – Âmbito de aplicação material – Pedido de anulação de um casamento, apresentado por um terceiro posteriormente ao falecimento de um dos cônjuges – Competência dos órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro de residência do requerente para se pronunciar sobre tal pedido



AG 26/5/2016 (C‑294/15, Mikołajczyk/Czarnecka et al.) concluiu o seguinte:

1) As ações de anulação do casamento intentadas após a morte de um dos cônjuges estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento (CE) n.° 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1347/2000, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 2116/2004 do Conselho, de 2 de dezembro de 2004. 

2) O âmbito de aplicação do Regulamento n.° 2201/2003, conforme alterado pelo Regulamento n.° 2116/2004, abrange as ações de anulação do casamento intentadas por uma pessoa diferente dos cônjuges. 

3) O artigo 3.°, n.° 1, alínea a), quinto e sexto travessões, do Regulamento n.° 2201/2003, conforme alterado pelo Regulamento n.° 2116/2004, não é aplicável às ações de anulação do casamento intentadas por uma pessoa diferente dos cônjuges. 




Bibliografia (348)



-- Doebert, A., Die Insolvenzanfechtung von Lohnzahlungen / Gläubigergleichbehandlung und Arbeitnehmerschutz (Duncker & Humblot: Berlin 2016)

-- Haack, S., Die Geburt der Dogmatik aus dem Geist des Prozesses, RTh 46 (2015), 281



Paper (203)


-- Jemielniak, J., Legal Interpretation and Adjudicatory Activism in International Commercial Arbitration (05.2016)
 
 

25/05/2016

Informação (132)


Direitos dos consumidores
no comércio electrónico


A Comissão propõe novas regras para uma melhor protecção dos consumidores no comércio electrónico. Para mais informações clicar aqui.

MTS


Bibliografia (347)


-- Thöne, M., Die Abschaffung des Exequaturverfahrens und die EuGVVO / Bestandsaufnahme, Bewertung, Ausblick (Mohr: Tübingen 2016)




Jurisprudência europeia (TJ) (95)


Reg, 44/2001 -- Reconhecimento e execução de medidas provisórias 
e cautelares -- Conceito de “ordem pública”


TJ 25/5/2016 (C‑559/14, Meroni/Recoletos) decidiu (versão portuguesa ainda não disponível):

El artículo 34, punto 1, del Reglamento (CE) n.º 44/2001 del Consejo, de 22 de diciembre de 2000, relativo a la competencia judicial, el reconocimiento y la ejecución de resoluciones judiciales en materia civil y mercantil, debe interpretarse, a la luz del artículo 47 de la Carta de los Derechos Fundamentales de la Unión Europea, en el sentido de que, en unas circunstancias como las examinadas en el litigio principal, no cabe considerar manifiestamente contrarios al orden público del Estado miembro requerido ni al derecho a un proceso equitativo, en el sentido de tales disposiciones el reconocimiento y la ejecución de un auto dictado por un órgano jurisdiccional de un Estado miembro sin oír a un tercero cuyos derechos son susceptibles de verse afectados por el referido auto, siempre que dicho tercero pueda invocar sus derechos ante ese órgano jurisdiccional.


 

Informação (131)



App do TJ


O TJ disponibilizou recentemente uma App para smartphones e tablets. Para mais informações clicar em PR 51/16.

MTS

 

Bibliografia (346)


-- Eusamio Mazagatos, E./Sánchez Rubio, A., La prueba ilícita en la doctrina de la Corte Suprema de Estados Unidos (Editorial Tirant lo Blanch: Valencia 2016)

-- Kovac, M./Vandenbergue, A.-S. (Eds.), Economic Evidence in EU Competition Law (Intersentia: Cambridge 2016)

-- Leible, S. (Ed.), General Principles of European Private International Law (Kluwer Law International: Alphen aan den Rijn 2016)

-- Muniz Espada, E., El deterioro del mercado hipotecario y la necesidad de su reconstrucción / Aportaciones desde el Derecho europeo (Editorial Civitas: Madrid 2016)

-- Pardo Iranzo, V., Competencia, reconocimiento y ejecución de resoluciones extranjeras en la Unión Europea (Editorial Tirant lo Blanch: Valencia 2016)

-- Rijavec, V./Kerestes, T./Ivanc, T. (Eds.), Dimensions of Evidence in European Civil Procedure (Kluwer Law International: Alphen aan den Rjin 2016)


Papers (202)

 


-- Guerra, A./Luppi, B./Parisi, F., Evidence Standards and Litigation: A Rent-Seeking Game (02.2016)

 

-- Tribe, J. P., Bankruptcy Tourism in the European Union: Myth or Reality? (05.2016)




Jurisprudência (358)



Petição inicial; correcção; ineptidão;
dever de esclarecimento



1. O sumário de RP 3/3/2016 (439/15.7T8VFR.P1) é o seguinte:
 

I - Deve ser admitido e deferido um pedido de retificação dos pedidos apresentados pelo autor na petição inicial pelo qual se invoca omissão da indicação da coordenada disjuntiva “ou” entre o pedido A e o pedido B, sendo aquele o de declaração de ineficácia em relação ao autor do ato de partilha e de reconhecimento do direito de praticar atos de conservação de garantia patrimonial autorizada por lei e executar determinados bens/direitos no património da segunda ré, na medida do necessário para obter a satisfação integral do crédito, e o pedido B, de declaração de nulidade do negócio titulado na aludida escritura de partilha, com fundamento em simulação absoluta.
 
II - Assim, deve ser admitida a correção da pretensão da ação a pedido do autor no sentido de que, deduzido um pedido próprio da impugnação pauliana e, em simultâneo, um pedido de nulidade por simulação de um determinado ato negocial, sem que se diga expressamente que são cumulativos, o segundo é alternativo/subsidiário do primeiro.
 
III - Nestas circunstâncias, a petição inicial não deve ser considerada inepta nos termos do art.º 186º, nºs 1 e 2, al. c), do Código de Processo Civil.
 

2. Na fundamentação do acórdão constam as seguintes passagens:

"[...] Não obstante as especialidades dos efeitos da nulidade por simulação que resultam dos art.ºs 242º e 243º do Código Civil, as suas consequências jurídicas são a não produção dos efeitos jurídicos associados, nos termos do art.º 286º e seg.s do Código Civil, designadamente o art.º 289º.

Temos assim que, enquanto o pedido típico da ação pauliana pressupõe a validade do ato e a respetiva procedência acarreta apenas a sua ineficácia relativamente ao credor impugnante, na medida do interesse deste, conforme atrás explanado, já a invocação da simulação e a sua procedência vão trazer, como consequência a sua nulidade e, por força desta, a não produção de efeitos jurídicos.

Manifestamente, não pode o autor numa ação de impugnação pauliana, simultaneamente, obter procedência com aquele fundamento e a declaração de nulidade do contrato com fundamento em simulação. O negócio impugnado, pressupondo-se válido para efeito da sua ineficácia relativamente ao impugnante, apenas na medida do interesse deste, não pode ser ao mesmo tempo declarado nulo, não produtor de qualquer efeito jurídico. É impossível a procedência simultânea daquelas duas pretensões. Por isso também não pode o autor deduzir tais pedidos conjuntamente, para que ambos procedam, por serem substancialmente ou intrinsecamente incompatíveis, ou seja, incompatíveis entre si, com efeitos inconciliáveis.

Resulta do art.º 186º, nº 2, al. c), que a petição inicial é inepta “quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis”. Sendo inepta a petição, é nulo todo o processo (nº 1).

Em todo o caso, o autor pode formular pedidos subsidiários. Pode apresentar ao tribunal um pedido para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder um pedido anterior (art.º 554º, nº 1). A oposição entre os dois pedidos não impede que sejam deduzidos subsidiariamente (nº 2 do mesmo artigo).

Quer isto significar que nada obstava a que na ação aqui em causa o A. deduzisse os dois pedidos que efetivamente deduziu: um deles típico da ação de impugnação pauliana, visando a declaração de ineficácia em relação a ele do ato de partilha referido no texto da petição inicial; o outro de declaração de nulidade da partilha, próprio da simulação que também invocou[9].

Pese embora a questão não seja pacífica, temos entendido que o pedido de impugnação pauliana deve ser deduzido em primeiro lugar, por se mostrar ser a mais conforme aos requisitos do artigo 554º e suas conexões normativas. Como dissemos, a impugnação pauliana aproveita apenas ao credor requerente, com exclusão dos demais credores daquele devedor (art.º 616º, nºs 1 e 4, do Código Civil), podendo consequentemente representar uma posição vantagem para ele em relação à declaração de nulidade, que redunda, como é sabido, em benefício de todos os credores (art.ºs 289º, n.º 1 e 605.º, n.º 2).

Como assim, esta forma de disposição dos pedidos, da parte do autor da ação, não é habitualmente aleatória, antes se adequa ao modo próprio da sua dedução quando um (segundo) é subsidiário do outro (o primeiro).

Retomando o caso concreto, foi o que o A. fez: deduziu em primeiro lugar o pedido da impugnação pauliana e, em segundo lugar, o pedido da simulação contratual.

Mas, tê-lo-á feito de modo cumulado ou a título subsidiário?

Dispõe o art.º 555º, nº 1, que “pode o autor deduzir cumulativamente contra o mesmo réu, num só processo, vários pedidos que sejam compatíveis, se não se verificarem as circunstâncias que impedem a coligação”.

Os pedidos são incompatíveis quando o sejam os efeitos jurídicos derivados da procedência de cada um deles, ou quando o reconhecimento de um excluir a possibilidade de verificação dos restantes, sejam eles emergentes ou não da mesma causa de pedir.

Na fundamentação da petição inicial não há uma discriminação absoluta entre as duas causas de pedir, mas evidenciam-se claramente, por grupos, os artigos que se repostam a uma e a outra, havendo outros artigos que são necessariamente comuns a ambas. A matéria da simulação está descrita sob os artigos 40º a 83º, no que à matéria de facto diz respeito; a restante respeita sobretudo à impugnação pauliana.

Nem da fundamentação nem da formulação dos pedidos resulta expressa a ideia de subsidiariedade entre o primeiro e o segundo. Mas não podemos deixar de dizer que também não está expressa a vontade do A. de apresentar as causas de pedir e os respetivos pedidos com intenção de obter um resultado cumulativo: a procedência de ambos.

A conclusão de que os pedidos são cumulativos como que se presume pelo facto de o A. não ter apontado a relação de subsidiariedade que deve existir entre eles, como aconteceria se, na sua formulação, os tivesse separado pela coordenada disjuntiva “ou”, ou tivesse utilizado, expressamente, o advérbio “subsidiariamente”, a expressão “a título subsidiário”, “em alternativa” ou outra que indicasse a relação de subsidiariedade.

Contudo, manda a verdade que se diga que também não consta declaração que expresse a vontade do A. de que pretende os dois efeitos (incompatíveis) dos dois pedidos que deduziu. Não consta, por exemplo, a coordenada copulativa “e” entre os dois pedidos da ação.

Porquê concluir, sem mais e irremediavelmente, que o A. quis a procedência dos dois pedidos?

Foi o A. que, após as contestações dos RR. e sem que para tal tivesse sido alertado pela parte contrária ou pelo tribunal, veio, a fl.s 295 verso (em 20.4.2015), pedir a relevação do que considerou ser um erro de escrita e que entre as al.s a) e b) dos pedidos, se considere «intercalada a conjugação “ou”», com os argumentos que expôs assim:

«1- ao formular os pedidos, no final da petição inicial, o A. optou por fazê-lo, organizando-os pelas alíneas a) e b).

2- Porém, entre uma e outra alínea, por lapso, nenhuma expressão intercalou, sendo verdade que pretendia intercalar a conjugação “ou”.

3- Na verdade, era e é vontade do A. formular o pedido contido em b) como pedido alternativo, a ser apreciado e decidido no caso de sucumbência do pedido formulado em a).

4- Pelo lapso de escrita que se descreve, torna-se necessário vir esclarecer os autos para que não subsistam dúvidas acerca da real intenção e vontade do A. aquando da formulação dos pedidos.
»

Vê-se, portanto, que o A. não quer a procedência dos dois pedidos. A sua vontade terá sido a de que, apenas na improcedência do pedido de impugnação pauliana, se apreciasse o pedido da simulação negocial; só que não o disse expressamente na petição inicial.

Por mera hipótese, se o A. nada tivesse dito e a ação prosseguisse para julgamento e subsequente decisão final com os pedidos tal como estão formulados na petição inicial, esta não teria que ser considera um peça imprestável, inútil ou condenada ao absoluto insucesso. Poderia então o tribunal decidir a ação em função dos factos que lograssem adesão de prova e, na procedência do pedido de impugnação pauliana, decidir do prejuízo que daí resultaria necessariamente para a apreciação do pedido deduzido, em acumulação, no segundo lugar (de simulação). Na improcedência do primeiro pedido, o tribunal conheceria do segundo.

Com ou sem procedência parcial da ação --- nunca poderia ser total, dos dois pedidos --- o tribunal não deixaria de conhecer do mérito da causa.

Então, porquê bloquear absolutamente a prossecução da ação quando ela não é uma peça imprestável, a falha existente não obsta a que dela se conheça de mérito e o A. pretende esclarecê-la, no sentido da subsidiariedade, em termos que os RR. muito bem compreendem e que são absolutamente compatíveis com a defesa já por eles desenvolvida nas respetivas contestações, até sem qualquer comprometimento do contraditório ou necessidade da sua renovação?

A situação é bem diferente de outras em que, definitivamente, há incompatibilidade entre os pedidos, como é o caso de ser pedido ao mesmo tempo, a condenação na realização da prestação e na omissão de a realizar, ou a resolução de um contrato e a condenação do réu no seu integral cumprimento. Há nestes casos uma clara contradição no objeto do processo (pedido individualizado pela causa de pedir) que impede a sua necessária identificação e gera claramente a nulidade do processo.

Ora, no exercício do dever de gestão processual, o juiz deve dirigir ativamente o processo, promovendo as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, garantindo a justa composição do litígio em prazo razoável (art.º 6º, nº 1). De igual modo, constitui dever elementar do processo civil o de colaboração entre as partes e entre estas e o tribunal, concorrendo para que se obtenha, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio, podendo o juiz, em qualquer altura, convidar alguma delas a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes (art.º 7º).

No despacho pré-saneador o juiz deve convidar as partes s suprir as irregularidades dos articulados, designadamente quando careçam de requisitos legais (art.º 590º, nº 2, al. b) e nº 3) ou a suprir insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada (subsequente nº 4).

Não apenas os fundamentos da petição inicial, mas também o próprio pedido integra aquela peça e pode conter irregularidades, insuficiências e imprecisões que não o comprometam totalmente, mas que justifiquem o seu aperfeiçoamento nos termos das referidas disposições, para que o tribunal fique rigorosamente esclarecido sobre a pretensão e possa prosseguir para a decisão final com a segurança necessária, prevenindo o risco da não realização da justiça. Convidar a parte a corrigir o pedido nessas circunstâncias é um imperativo do interesse último do processo, da justa composição do litígio em tempo razoável.

Do art.º 186º, nºs 1 e 2, al. c), resulta que a petição inicial é inepta e o processo é todo nulo quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.

Esta norma não é incompatível com a possibilidade de correção da petição inicial quando se justifique a correção de um lapso, um esclarecimento, a supressão de uma insuficiência ou de uma mera irregularidade.

Sabendo-se que o autor --- como vimos já --- pode deduzir na petição inicial, simultaneamente, um pedido de ineficácia de um determinado ato jurídico com base em impugnação pauliana e um pedido de nulidade por simulação negocial, contanto que sejam subsidiários um do outro, na dúvida, nada obsta a que o tribunal solicite ao demandante o esclarecimento sobre se os deduz a título subsidiário e qual seja o pedido principal.

Por maioria de razão, deve admitir-se que o autor, por iniciativa própria, terminados os articulados da ação, venha aos autos esclarecer que, por lapso, nenhuma expressão intercalou entre o pedido a) e o pedido b), sendo sua vontade intercalar ali a coordenada disjuntiva “ou”. 

O nº 2 do art.º 146º estabelece que “deve ainda o juiz admitir, a requerimento da parte o suprimento ou a correção de vícios ou omissões puramente formais de atos praticados, desde que a falta não deva imputar-se a dolo ou culpa grave e o suprimento ou a correção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa”.

A omissão em que o A. incorreu na não indicação da natureza subsidiária do pedido b)[...] não pode considerar-se dolosa ou gravemente culposa, nem, só por si, conduzir ao fracasso absoluto da ação, sob pena de contrariar frontalmente os objetivos do processo, inutilizando-o totalmente em circunstância que impõem o seu aproveitamento.

O suprimento da omissão, não é mais do que uma correção na formalização dos pedidos, traz vantagem relevante para o processo, desde logo quanto à eficácia e à celeridade, dado o aproveitamento dos atos praticados, é simples e nem sequer justifica novo contraditório, pois que se mantêm, sem tirar nem por, os fundamentos da ação expostos na petição inicial e para os quais os RR. desenvolveram já a defesa nas respetivas contestações, sem sequer terem manifestado ali serem contra a cumulação dos pedidos."


3. A fundamentação do acórdão merece total concordância. Embora possa parecer que se trata de um pormenor, a verdade é que o autor não tinha apresentado os dois pedidos que formulou nem como conjuntos, nem como alternativos ou subsidiários. Nesta circunstância, incumbia ao tribunal de 1.ª instância, fazendo uso do seu dever de esclarecimento (cf. art. 7.º, n.º 2, CPC), ter procurado informar-se sobre a modalidade de cumulação de pedidos que o autor tinha apresentado na petição inicial.

Neste contexto legal, nunca o tribunal de 1.ª instância devia ter indeferido o requerimento de rectificação da petição inicial apresentado pelo autor e, na sequência disso, indeferido essa petição com fundamento numa cumulação substancialmente incompatível de pedidos (cf. art. 186.º, n.º 2, al. c), CPC). Num certo sentido, o tribunal de 1.ª instância violou o dever de esclarecimento duas vezes: ao não fazer uso desse dever e ao rejeitar o esclarecimento apresentado pelo autor. 

MTS


24/05/2016

Jurisprudência (357)



Dívidas dos cônjuges; dívida própria;
 litigância de má fé


1. O sumário de RP 7/3/2016 (5376/12.4T2AGD-A.P1) é o seguinte: 

I - A simples prova da celebração de um empréstimo para amortização de um outro anteriormente contraído e utilizado para aquisição de ações do mutuante, não é bastante para que se qualifique o último empréstimo como um ato de administração ordinária.

II - A celebração de um empréstimo para amortização de um outro anteriormente contraído e utilizado para aquisição de ações do mutuante não reúne as características para que “se possa considerar aplicad[o] em proveito comum aos olhos de uma pessoa média e, portanto, à luz das regras da experiência e das probabilidades normais”.

III - Litiga de má-fé o exequente que cientemente alega factos falsos para corresponsabilizar o cônjuge do subscritor do título extrajudicial exequendo.
 

2. O acórdão contém a seguinte passagem:

"[...] o conceito de acto de administração ordinária está mais talhado para a administração de um certo património do que para a contracção de dívidas, salvo quando a assunção desse passivo se relacionar com a conservação ou frutificação de certo bem ou massa patrimonial.

A subsunção de dada hipótese de facto à previsão da alínea c), do nº 1, do artigo 1691º do Código Civil exige:

- uma dívida contraída na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador;

- que essa contracção tenha sido em proveito comum do casal;

- que essa dívida tenha sido contraída com respeito dos limites dos poderes de administração do cônjuge administrador.

No caso em apreço, a dívida exequenda foi contraída em 31 de março de 2010. ou seja, na constância do casamento de ambos os executados.

A factualidade provada não permite enquadrar a contracção da obrigação exequenda pelo executado em qualquer das previsões do nº 2, do artigo 1678º do Código Civil, pelo que apenas se poderá concluir que foi assumida nos limites dos seus poderes de administração se acaso se puder afirmar que a contracção da obrigação exequenda constitui um ato de administração ordinária.

A obrigação exequenda foi contraída para amortizar parte de um empréstimo anteriormente contraído para aquisição de ações do exequente. Assim, embora a celebração de novo empréstimo tenha operado a redução do capital anteriormente mutuado, não implicou qualquer diminuição do passivo do casal e, porventura, pode até ter implicado o seu aumento se acaso o novo empréstimo contraído e aqui em execução foi contratado em condições mais onerosas do que o empréstimo parcialmente amortizado. Por outro lado, a celebração desse empréstimo não teve como contrapartida a aquisição de quaisquer bens, nomeadamente ações, pois que já haviam sido anteriormente adquiridas com o empréstimo de um milhão e oitocentos mil euros.

Neste circunstancialismo, não existem dados de facto que permitam qualificar o ato do executado como de mera administração ordinária.

Ainda que assim não fosse, não resulta da factualidade provada que o referido ato foi outorgado em proveito comum do casal. De facto, não há quaisquer dados que permitam lobrigar qual foi a finalidade visada pelo executado com o citado ato e, por outro lado, no que respeita a intenção objetiva de proveito comum, não se nos afigura que a dívida exequenda “se possa considerar aplicada em proveito comum aos olhos de uma pessoa média e, portanto, à luz das regras da experiência e das probabilidades normais” [
Citação extraída de Curso de Direito da Família, Volume I, 4ª edição Reimpressão, Coimbra Editora, março 2014, Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, página 411.]."

MTS