"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



26/10/2016

Jurisprudência (462)


Bens comuns; usufruto; partilha;
usufruto de créditos



1. O sumário de RP 30/5/2016 (696/12.0TBVLG.P1) é o seguinte: 

I - Na constância do matrimónio, os bens do casal constituem um património a que a lei confere determinada autonomia e que pertence, em comum, ao marido e à mulher, embora sem repartição de quotas ideais, sendo assim, uma comunhão sem quotas.
 
II - Recaindo o usufruto sobre a meação dos bens comuns do ex-casal, ou seja, sobre parte não determinada (valor e objecto) desses bens e, na conferência de interessados, o requerido cessionário optou por não licitar quaisquer bens (saliente-se que os bens foram, obviamente, postos a lanço por inteiro), sem oposição da usufrutuária interessada, a meação cedida por esta ficou preenchida com o valor de tornas.
 
III - O usufruto constituído passou a incidir unicamente sobre o valor (direito de crédito/usufruto de crédito) das tornas a receber pelo cessionário.
 
IV - O mapa da partilha deve ser organizado com respeito pelo despacho sobre a forma da partilha e em conformidade com o preenchimento dos quinhões resultante do acordado na conferência de interessados (artº 1375º, do CPC).
 

2. O usufruto incidia inicialmente sobre a meação dos bens comuns do casal e passou a recair, depois da partilha destes bens, sobre o crédito de tornas: daí ter-se tornado um usufruto de créditos (cf. art. 1439.º CC). Verificou-se assim uma sub-rogação no objecto do usufruto, com a particularidade de que o seu objecto é agora um direito de crédito (ou, pelo menos, um direito a uma prestação).

Nesta perspectiva, algo de semelhante ocorre por força do efeito sub-rogatório estabelecido no art. 824.º, n.º 3, CC: o direito que um terceiro tinha sobre a coisa vendida na execução transmitem-se para o produto obtido nesta venda. Também aqui o terceiro adquire um direito a uma prestação em substituição do direito real originário.

Pode levantar-se a questão de saber se o direito de crédito (ou a uma prestação) que resulta da sub-rogação (em qualquer dos casos acima referidos) tem alguma característica do direito real que ficou sub-rogado. Qualquer que seja a resposta, é um tema que merece análise e reflexão.

MTS