"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



30/12/2016

FELIZ ANO NOVO!



Jurisprudência (520)



Documento; junção em recurso; prova plena;
confissão extrajudicial; impugnação


1. O sumário de RP 26/9/2016 (1203/14.6TBSTS.P1) é o seguinte:

I - Da articulação lógica entre o artigo 651º, nº 1 do CPC e os artigos 425º e 423º do mesmo Código resulta que a junção de documentos na fase de recurso, sendo admitida a título excepcional, depende da alegação e da prova pelo interessado nessa junção de uma de duas situações: (1) a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso; (2) ter o julgamento de primeira instância introduzido na acção um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional.
 
II - Quanto ao primeiro elemento, a impossibilidade refere-se à superveniência do documento, referida ao momento do julgamento em primeira instância, e pode ser caracterizada como superveniência objectiva ou superveniência subjectiva. 
 
III - Objectivamente, só é superveniente o que historicamente ocorreu depois do momento considerado, não abrangendo incidências situadas, relativamente a esse momento, no passado. Subjectivamente, é superveniente o que só foi conhecido posteriormente ao mesmo momento considerado. 
 
IV - Neste caso (superveniência subjectiva) é necessário, como requisito de admissão do documento, a justificação de que o conhecimento da situação documentada, ou do documento em si, não obstante o carácter pretérito da situação quanto ao momento considerado, só ocorreu posteriormente a este e por razões que se prefigurem como atendíveis. 
 
V - Só são atendíveis razões das quais resulte a impossibilidade daquela pessoa, num quadro de normal diligência referida aos seus interesses, ter tido conhecimento anterior da situação ou ter tido anteriormente conhecimento da existência do documento. 
 
VI - No documento autêntico, o documentador garante, pela fé pública de que está revestido, que os factos, que documenta, se passaram; mas não garante, nem pode garantir, que tais factos correspondem à verdade.
 
VII - A escritura pública de permuta não faz prova plena de que uma das parte tenha pago à outra determinada quantia; porém, a declaração dessa parte perante o notário de já ter recebido o preço, tem este valor, porquanto implica o reconhecimento de um facto que lhe é desfavorável, e que o artigo 352.º do CCivil qualifica de confissão.
 
VIII - Trata-se de uma confissão extrajudicial, em documento autêntico, feita à parte contrária, admissível pela sua própria essência, que goza de força probatória plena contra o confitente (artigos 355.º, n.º s 1 e 4, e 358.º, n.º 2, do CCivil).
 
IX - A parte é admitida a destruir a força da confissão de haver recebido a quantia em causa, mediante a prova da realidade do facto contrário àquele que a confissão estabeleceu, mas não pode usar da prova testemunhal, desde que não seja arguida a falsidade da escritura pública ou a nulidade ou da confissão por falta ou vícios de vontade.
 
X - Celebrado o contrato definitivo (cumprida a obrigação principal), só podem continuar a ser invocadas as cláusulas do contrato promessa que consagrem prestações conexas que assumam autonomia própria, que surjam “desvinculadas” da obrigação principal da contrapa.
 
2. Na fundamentação do acórdão pode ler-se o seguinte: 

"Na sua alegação requerem os apelantes a junção aos autos de um documento de que apenas agora tiveram conhecimento e que, por isso mesmo, não puderam em momento anterior carrear para o processo.
 
Trata-se de um documento datado de 27 de Julho de 1992, intitulado “Aditamento ao contrato celebrado em 17.07.1990”, em que figuram como partes, de um lado, V… e D… (Autora falecida na pendência da causa) e, do outro, a sociedade Z…, Lda. (posteriormente incorporada na aqui Apelada).
 
Invocam os Autores, para sustentar a admissibilidade da junção deste documento nesta fase do processo, o disposto nos artigos 651.º n.º 1 e 425.º do Código de Processo Civil.
 
Vejamos, então, se tal admissão se mostra possível.
 
À questão da junção de documentos na fase de recurso se refere expressamente o artigo 651º, nº 1 do CPC, cujo teor ora se transcreve:
 
Artigo 651º
Junção de documentos e de pareceres
1-As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425º ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.

E dispõe o artigo 425º para o qual remete o texto da norma acabada de transcrever:
 
Artigo 425º
Apresentação em momento posterior
Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
 
E importará ter presente, enfim, enquanto norma contendo o “princípio geral” que referencia, na dinâmica do processo, o momento da apresentação de prova por documentos, o artigo 423º do CPC:
 
Artigo 423º
Momento da Apresentação
1-Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2-Se não forem juntos com o articulado respectivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3-Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior. 
 
Da concatenação destas normas decorre, que a junção de documentos em sede de recurso (junção que é positivamente considerada apenas a título excepcional) depende da caracterização (rectius, da alegação e da prova) pelo interessado nessa junção de uma de duas situações: (1) a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso, valendo aqui a remessa do artigo 651º, nº 1 para o artigo 425º; (2) o ter o julgamento da primeira instância introduzido na acção um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional, que até aí-até ao julgamento em primeira instância-se mostrava desfasada do objecto da acção ou inútil relativamente a este. 
 
Os documentos em referência nos citados artigos são habitualmente designados de documentos supervenientes, sendo que, e a sua superveniência pode ser objectiva, nos casos em que o documento só foi produzido em momento posterior ao do encerramento da discussão ou subjectiva, quando o documento, apesar de já existir, só chegou ao conhecimento da parte depois desse momento.
 
Neste caso invocam os Autores a superveniência subjectiva do documento, já que este, sendo datado de 27-07-1992, existia mesmo antes da data da proposição da acção (afastando-se, assim, liminarmente, a hipótese de superveniência objectiva).
 
Como se sabe, a junção de documentos na instância de recurso obedece, como não poderia deixar de ser, a regras particularmente restritivas.
 
Como supra se referiu, com as suas alegações do recurso de apelação, as partes só podem juntar documentos, objectiva ou subjectivamente, supervenientes, isto é, cuja apresentação foi impossível até à apresentação dessas alegações ou cuja junção se torne necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância (artº 524 nºs 1 e 2 e 693-B, 1ª parte, do CPC). 
 
Todavia, esta faculdade não compreende o caso de a parte pretender oferecer um documento que poderia–e deveria–ter oferecido naquela instância.
 
Com efeito, quando ocorra uma dessas situações, a parte que pretenda oferecer o documento deve, demonstrar a impossibilidade da junção do documento no momento normal, ou seja, alegando e demonstrando o carácter objectivo ou subjectivamente superveniente desse mesmo documento.
 
Ora, no que concerne à superveniência subjectiva não basta invocar que só se teve conhecimento da existência do documento depois do encerramento da discussão em 1ª instância, pois que, dessa forma permitir-se-ia que fossem acolhidas todas as incúrias e imprevidências das partes.
 
Portanto, a parte deve alegar e provar a impossibilidade da sua junção naquele momento e, como tal, que o desconhecimento da existência do documento não deriva de culpa sua. 
 
Efectivamente, a superveniência subjectiva pressupõe o desconhecimento não culposo da existência do documento, sendo que, em qualquer caso, a parte deve alegar e demonstrar que o desconhecimento do documento não ficou a dever-se uma negligência sua, já que só desse modo o documento pode ter-se por subjectivamente superveniente [cfr. neste sentido, João Espírito Santo, O Documento Superveniente para efeito de recurso ordinário e extraordinário, pág. 47.].
 
Sopesando, não basta alegar a superveniência subjectiva do documento, sendo ainda exigível à parte a prova quer do não conhecimento tempestivo do documento, quer da inimputabilidade a uma culpa própria da ignorância da existência dele.
 
Todavia, só são atendíveis razões das quais resulte a impossibilidade daquela pessoa, num quadro de normal diligência referida aos seus interesses, ter tido conhecimento anterior da situação ou ter tido anteriormente conhecimento da existência do documento, pois que, como se refere no Ac. da RC de /11/2014[2] a “(…) a questão não é o que “não se sabe”, “porque não se sabe”-ninguém sabe aquilo que não teve acuriosidade ou o cuidado de averiguar-a questão é o que justificadamente alguém “não podia saber, mas veio a saber mais tarde” e só neste caso se fala em superveniência subjectiva.”
 
[MTS]
 
 

29/12/2016

Bibliografia (447)


-- Rosenberg, S., Change of Control-Klauseln in der Insolvenz (RWS Verlag: Köln 2016)

-- Weiß, A., Insolvenzspezifische Geschäftsführerhaftung / Zahlungsverbote, Existenzvernichtung und Insolvenzverschleppung (RWS Verlag: köln 2016)



Jurisprudência (519)


Acção popular; interesses difusos; legitimidade popular;
créditos bancários; modo de pagamento



1. O sumário de STJ 8/9/2016 (7617/15.7T8PRT.S1) é o seguinte:

I - A ação popular tem como objecto a tutela de interesses difusos (o que compreende os interesses difusos stricto sensu, os interesses colectivos e os interesses individuais homogéneos), os quais se caraterizam por possuírem uma dimensão individual e supra individual, pela sua titularidade caber a todos e a cada um dos membros de uma classe ou de um grupo (independentemente da sua vontade) e por recaírem sobre bens que podem ser gozados de forma concorrente e não exclusiva.

II - Os interesses individuais homogéneos são definíveis como situações jurídicas genericamente consideradas, correspondendo aos interesses de cada um dos titulares de um interesse difuso ou de um interesse colectivo.

III - A tutela do interesse difuso supõe a abstração de particularidades respeitantes a cada um dos titulares, pois o que sobreleva é a proteção do interesse supra individual e a prossecução da finalidade visada com a sua criação na ordem jurídica, o que prescinde da apreciação de qualquer especificidade; porém, quando por intermédio daquela acção se almeje a tutela de um interesse colectivo, releva a proteção de situações individuais dos respectivos titulares, sendo que tal é admissível apenas até ao limite em que seja aceitável uma apreciação indiferenciada das mesmas, sem que, contudo, se dispense a análise individualizada de cada uma.

IV - Posto que a ação popular não é admissível quando o demandado possa invocar diferentes defesas contra os vários representados, deve-se atentar na posição por este assumida, assumindo-se assim aquela possibilidade como um critério prático para discutir a sua admissibilidade.

V - A legitimidade popular deve ser aferida em função do poder de representação dos titulares do interesse por parte do autor popular e do seu interesse na demanda, sendo que os representados devem todos ter sido atingidos pela violação do mesmo interesse difuso ou estarem em risco de o serem.

VII - A adequação da representação pressupõe a inexistência de um conflito de interesses entre o autor popular e os titulares do interesse difuso e a garantia de que a sua atuação permite substituir a presença daqueles em juízo.

VIII - Invocando os autores um interesse pretensamente partilhado por todos os clientes da ré – o pagamento de prestações dos créditos bancários para habitação através de qualquer meio idóneo para o efeito, nomeadamente contas bancárias sedeadas noutras instituições – que não está a ser por esta respeitado e as respectivas consequências, é de considerar que estamos perante a defesa de interesses colectivos (que se prendem com a forma de amortização dos ditos financiamentos), não revelando a causa de pedir ou o pedido quaisquer particularidades derivadas da multiplicidade dos factos que caraterizam as relações entre o banco e os seus mutuários.

IX - Sendo possível, face à definição do objeto da causa, proceder a uma apreciação indiferenciada da situação de cada um dos mutuários, competirá ao tribunal, uma vez apuradas as suas particularidades, apreciar se as mesmas inviabilizam uma tomada de decisão numa ação popular ou se, pelo contrário, os elementos factuais que são comuns a todas elas se revelam prevalentes, sempre tendo em vista a necessidade de abstração referida em III.

X - O juízo de manifesta improcedência previsto no art. 13.º da Lei n.º 83/95, de 31-08, supõe a inexistência do
fumus boni iuris.
 
2. Tem interesse conhecer esta parte da fundamentação do acórdão:
 
"O interesse invocado pelos autores consiste, fundamentalmente e em face do pedido principal formulado por estes, no interesse de “a todos os clientes da Ré, titulares de contratos de crédito para a aquisição de imóvel habitação, entre os quais os Autores, seja reconhecido o direito a procederem ao pagamento das prestações correspondentes a esses mesmos contratos através de qualquer meio idóneo, nomeadamente, mas não exclusivamente, por débito em conta de depósitos à ordem de que sejam legítimos titulares e com poderes para movimentação junto de qualquer instituição bancária a operar em Portugal ou crédito de dinheiro em conta titulada pela Ré em Portugal com a indicação que permita identificar o contrato para pagamento”.

Os autores alegam que esse interesse foi e está a não ser respeitado pela ré, daí decorrendo determinadas consequências para os autores e demais clientes da mesma e a obrigação desta ré em reconhecer esse interesse – ou os interesses constantes dos pedidos formulados subsidiariamente – ao nível do domicílio do pagamento das prestações, do enceramento de contas de depósito à ordem e de pagamento de comissões de gestão.
 
Ora, em face disto e dos conceitos acima referidos, entendemos que estamos perante interesses coletivos, passiveis de serem invocados numa ação popular.

Na verdade, o que está aqui em causa é o interesse ou interesses dos autores e de cada um dos titulares de contratos de crédito para habitação, interesse ou interesses estes definidos nos termos acima referidos, fundamentalmente ligados ao pagamento das prestações.
 
O que os autores pretendem defender não é só a sua situação individual, mas também a de uma massa de interesses individuais de outros titulares de empréstimos para habitação.

Face ao objecto da presente ação – definido, como se sabe, pelo pedido e pela causa de pedir - não estão aqui em causa quaisquer particularidades, nomeadamente as decorrentes da eventual “multiplicidade dos factos que caraterizam a relação do Banco com todos e cada um dos seus mutuários”, como se escreveu na sentença recorrida, particularidades estas que, eventualmente e em fase ulterior do processo poderão ser apreciadas.

Apenas está em causa se num contrato de crédito para a aquisição de imóvel para habitação aos autores e a demais titulares dos contratos deve ser reconhecido o direito de procederem aos pagamento das prestações correspondentes a esses contratos através de qualquer meio de pagamento idóneo, ou então, se devem ser reconhecidos os outros direitos invocados subsidiariamente pelos autores.

Tal como a ação foi proposta, é perfeitamente possível uma apreciação indiferenciada de cada um dos titulares dos empréstimos, sendo que competirá ao Tribunal, numa fase ulterior do processo, averiguar se as particularidades invocadas pela ré podem ser abstraídas para a tomada de uma decisão numa ação popular, tendo sempre em atenção, como acima ficou referido, que a tutela coletiva não é possível sem a abstração do “lastro de individualização” que é caraterística das situações “standard”.

Há que ter sempre em atenção que os elementos de facto a ter em conta não são só os que eventualmente existam como específicos de cada situação, mas também os elementos de facto comuns a todas elas, devendo o Tribunal exercer o devido controlo sobre a prevalência daqueles primeiros elementos que eventualmente existam sobre os elementos de facto comuns que sustentam os pedidos formulados, sem nunca perder de vista a tendencial abstração daqueles elementos particulares como base quase necessária para a possibilidade da existência da ação popular.

Na verdade, se qualquer elemento particular invocado por um demandante fosse suficiente para descaraterizar imediatamente o interesse como coletivo, praticamente seria impossível a existência de qualquer ação popular, ficando esta, na realidade, na disponibilidade daquele.

Finalmente, há que dizer que não se revela, desde já, qualquer conflito de interesses entre os autores e os outros titulares do interesse comum por eles invocado, antes e pelo contrário, revela-se, tal como a questão é posta pelos autores, essa comunidade.

Na verdade e tendo em conta o núcleo da matéria posta à apreciação do Tribunal – repete-se, fundamentalmente relacionada com o pagamento das prestações de empréstimos para habitação – à partida e sem prejuízo da ulterior apreciação da preponderância de qualquer situação particular que torne impossível a sua abstração para aquele efeito, parece-nos ser evidente que é do interesse de qualquer daqueles titulares que lhe seja reconhecido “o direito a procederem ao pagamento das prestações (…) através de qualquer meio idóneo”, sendo certo que poderão exercer ou não e da forma que tiverem por mais conveniente, a faculdade contida nesse direito, se reconhecido."
 
[MTS]
 
 

28/12/2016

Bibliografia (446)


-- Fernández de Buján, A. (Dir.) / Serrano de Nicolás, Á. (Coord.), Comentarios a la Ley 15/2015, de la jurisdicción voluntaria (Editorial Civitas, SA: Madrid 2016)



Paper (254)



-- Caponi, R., Prospective Overruling: Bilancio di una vicenda (2012) (via academia.edu)


Nota: o paper (de um dos mais importantes processualistas italianos da actualidafe) trata do problema da eficácia retroactiva das mudanças de jurisprudência, um tema que, especialmente atendendo aos acórdãos de uniformização de jurisprudência, deve merecer, como já várias vezes se sublinhou neste Blog, a atenção da jurisprudência e da doutrina portuguesas.

MTS


Informação (158)


Custas processuais


A L 42/2016, de 28/12 (Orçamento do Estado para 2017) contém os seguintes artigos:


Artigo 265.º
Alteração ao Regulamento das Custas Processuais

O artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado em anexo ao Decreto -Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, alterado pelas Leis n.os 43/2008, de 27 de agosto, 64 -A/2008, de 31 de dezembro, e 3 -B/2010, de 28 de abril, pelo Decreto -Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, que o republica, pela Lei n.º 66 -B/2012, de 31 de dezembro, e pelo Decreto -Lei n.º 126/2013, de 30 de agosto, e pelas Leis n.os 72/2014, de 2 de setembro, e 7 -A/2016, de 30 de março, passa a ter a seguinte redação: 

«Artigo 4.º […] 

1 —  [...]
aa) As vítimas dos crimes de mutilação genital feminina, escravidão, tráfico de pessoas, coação sexual e violação, previstos e puníveis, respetivamente, nos termos do disposto nos artigos 144.º -A, 159.º, 160.º, 163.º e 164.º, todos do Código Penal, quando intervenham no respetivo processo penal em qualquer das qualidades referidas nos artigos 67.º -A a 84.º do Código de Processo Penal. 
[...] » 


Artigo 266.º 
Não atualização do valor das custas processuais

Em 2017, é suspensa a atualização automática da unidade de conta processual (UC) prevista no n.º 2 do artigo 5.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, mantendo-se em vigor o valor da UC vigente em 2016.



Jurisprudência (518)




Documento superveniente; simulação processual;
recurso de revisão; legitimidade para recorrer


1. O sumário de RP 13/9/2016 (1871/10.8TBVCD-C.P1) é o seguinte:

I - Criado pelo Código do Processo Civil de 1939, o recurso extraordinário de revisão, hoje previsto no art. 696º, visa a alteração de uma decisão já transitada em julgado apenas em situações limite, taxativamente previstas na lei.
 
II - Designadamente uma decisão transitada em julgado pode ser objeto de revisão quando “se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.”
 
III - Os documentos atendíveis como fundamento da revisão da decisão transitada em julgado nos termos estabelecidos na al. c) do art. 696º terão de preencher, cumulativamente, os requisitos da novidade e da suficiência; este último exige que esses documentos, o seu teor, infirmem, de “per si”, os fundamentos da decisão a rever.
 
IV - Nos casos em que as partes, de comum acordo, criam a aparência dum litígio para obter uma sentença cujo efeito pretendem, mas que lesa um direito de terceiro ou viola uma lei imperativa predisposta no interesse geral, a simulação assume a dimensão de uma fraude processual.
 
V - A alínea g) do art. 696.º permite a revisão de uma sentença transitada em julgado quando se alegue estarmos perante um litígio assente sobre acto simulado das partes.
 
VI - Sintomaticamente a lei coloca o acento tónico no litígio e não no comportamento das partes. Deste modo, para apurar da verificação liminar deste requisito, importa apurar se foi alegado que o litígio vertido nos articulados – petição, contestação – teria sido assente exclusivamente numa fraude, ou simulação, processual.
 
VII - Deste modo, ainda que uma das partes desconheça essa eventual simulação mas tenha subscrito uma contestação, conjuntamente com o então marido, a qual corporize esse acto simulado, teremos de concluir que o litígio foi falsamente erigido, estando, assim, “assente sobre acto simulado das partes”.
 
VIII - O recurso de revisão assente na verificação da alínea g) do art. 696.º do CPC apenas “pode ser interposto por qualquer terceiro que tenha sido prejudicado com a sentença”.
 
IX - Fazem parte deste conceito de “terceiro” os
herdeiros legitimários, conforme entendimento já consagrado pela doutrina no Código do Processo Civil de 1939 para o então denominado recurso extraordinário de oposição de terceiro de teor mais restrito que o regime actual.

2. Da fundamentação do acórdão extrai-se a seguinte parte:

"[...] o recurso de revisão não pode ser utilizado nomeadamente para reabrir uma discussão dos factos já determinados na decisão transitada em julgado; daí que se exija o requisito da novidade destes documentos em relação aos meios de prova que foram considerados no processo. Do mesmo modo, o documento tem que assumir contornos que legitimem a conclusão segundo a qual a sua junção será suficiente; donde, esse documento não deverá ser tido em conta se o respectivo teor não infirma, por si só, os fundamentos da decisão a rever, subsistindo, perante eles, ainda assim, o motivo em que se sustentou o juízo decisório (neste sentido, por todos e entre vários outros, citando Acórdão do STJ de 17.9.2009, o Acórdão desta Relação de 2 de Dezembro de 2014, disponível em dgsi.pt, processo 536/2002.C1-A).

Os documentos ora juntos pretendem demonstrar que a quantia que entrou no património do casal, os pais das autoras, terá saído logo no dia seguinte para benefício de uma sociedade que hoje tem como único sócio o ora 2º demandado, pai das demandantes. 

Deste modo, encontrar-se-ia indiciado que a quantia em apreço nos autos não teria integrado, na verdade, o património comum do casal e que a mulher dela não teria retirado qualquer proveito.

Contrapõe doutamente o tribunal “a quo” que a comunicabilidade da dívida à ré, mãe das demandantes, teria sido apurada pelo tribunal, não por aplicação do disposto no art.1691º, nº1, alíneas c) e d) do Código Civil – relativa ao proveito comum do casal – mas, sim, da alínea a) concernente ao consentimento da cônjuge mulher. E assim é, de facto (leia-se neste sentido o Acórdão da Relação do Porto que confirmou a sentença proferida pela primeira instância, no qual se alerta, justamente, para tal circunstância [...]). 

Os documentos juntos nada permitem inferir quanto ao consentimento, ou não, da F… relativamente à situação descrita; como bem admitem as próprias recorrentes nas suas alegações, o apuramento, ou não, desse consentimento “apenas seria legítimo extrair-se após a produção da prova dos factos que as recorrentes invocaram como causa de pedir complexa do recurso de revisão”. 
 
Simplesmente, [...] não é esta a previsão normativa da alínea c) do art. 696.º do CPC que exige que os documentos fossem suficientes, de “per si”, para extrair essa conclusão de ausência de consentimento. 

Ora, como parecem implicitamente as próprias recorrentes reconhecer, essa asserção imporia reabrir a discussão e apurar novamente dos factos e das provas analisados no processo já transitado em julgado justamente o que a lei quis vedar ao impor este requisito relativo à admissibilidade do recurso de revisão.

Comungamos, portanto, do entendimento do tribunal apelado segundo o qual os documentos apresentados não são suficientes para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

Resta a apreciação da alínea g) do art. 696.º quanto à demonstração de que estaremos perante um litígio assente sobre acto simulado das partes. 

Segundo o tribunal de primeira instância, na própria versão das recorrentes, a alegada simulação não terá existido pelas partes, na medida em que a mãe destas, ora demandada, não agiu simuladamente. Por sua vez, contrapõem as apelantes que, por ter sido a acção contestada em conjunto e num só articulado pelos seus pais, se verifica, por força dessa posição processual conjunta, uma verdadeira e efectiva simulação processual.

Nas palavras de Lebre de Freitas (C. Proc. Civil Anotado, Vol. II, 2ª Ed. p. 695 e 696) “Tem lugar a simulação processual quando as partes, de comum acordo, criam a aparência dum litígio inexistente para obter uma sentença cujo efeito apenas querem relativamente a terceiros, mas não entre si. Tem lugar a fraude processual quando as partes, de comum acordo, criam a aparência dum litígio para obter uma sentença cujo efeito pretendem, mas que lesa um direito de terceiro ou viola uma lei imperativa predisposta no interesse geral”.

No caso concreto, teríamos uma eventual fraude processual: a sociedade por quotas, primeira demandada, ter-se-ia conluiado com o demandado G… para alegar um mútuo inexistente em ordem a obter uma sentença que apurasse uma dívida igualmente inexistente do património comum do casal, G… e F….

De todo modo, citando o mesmo Lebre de Freitas, “a simulação do litígio, comum a ambas as figuras, passa quase sempre, mediante prévio acordo das partes, entre si conluiadas, pela alegação pelo A., não contraditada ou ficticiamente contraditada pelo R., duma versão fáctica não correspondente à realidade”. 

Ora, a nosso ver, processualmente foi justamente essa a arquitectura processual que se verificou nos articulados. 

Uma versão alegadamente simulada construída a partir de factos falsos alegados no petitório pela sociedade autora e uma contestação também ela falsa e artificialmente construída pelo réu G…o de modo a conseguir um resultado danoso para o património do casal. É certo que a F… não terá participado dessa simulação que desconhecia; mas igualmente nada fez para dela se desmarcar; deste modo, em termos processuais, a simulação, salvo melhor opinião, subsiste incólume na justa medida em que a única contestação junta aos autos, subscrita também pela F…, colaborou activamente nessa “verdade forjada” e não se demarcou dessa versão dos factos, por exemplo por via da apresentação de uma contestação autónoma ou, no mínimo, pela não subscrição da versão alegadamente forjada dos factos.

Parece-nos, portanto, em rigor, que se verificou - em termos de mera alegação conducente ao prosseguimento do presente recurso de revisão - por acção directa de todos os envolvidos, um litígio totalmente assente sobre acto simulado das partes.

Reforce-se que a lei põe o acento tónico na litígio em si mesmo e não no comportamento das partes, individualmente consideradas.

Ou seja, o litígio vertido nos articulados – petição, contestação – teria assentado exclusivamente numa fraude processual; uma das partes desconheceria essa aventada simulação mas, ao subscrever uma contestação conjunta com o então marido, acabou por colaborar activamente no erigir desse falso litígio. A contestação dela foi conjunta à do marido e é, objectivamente, pelo teor desta que teremos de qualificar o litígio; assim sendo, concluímos que foi “o litígio assente sobre acto simulado das partes”.

Tem, pois, fundamento bastante o recurso de revisão deduzido."
 
[MTS]
 
 

Jurisprudência (517)



Processo de inventário; 
honorários notariais


O sumário de RP 13/9/2016 (191/16.9YRPRT) é o seguinte:

I – Ao novo processo de inventário da Lei nº 23/2013, de 5 de Março (diploma que aprovou o “Regime Jurídico do Processo de Inventário”) não é aplicável o Regulamento das Custas Judiciais quanto à fixação do montante de honorários notariais devido a final, mormente o nº7 do art. 6º deste, no qual se prevê a possibilidade de ser dispensado o pagamento relativo ao remanescente ainda por pagar, porquanto a Portaria 278/2013 de 26 de Agosto que regulamentou o dito processo de inventário, fixa um regime especial quanto a esse particular, ao ter regulamentado de forma expressa as “custas do processo de inventário”, e havendo um especial rigor e detalhe na previsão e estatuição sobre os critérios, regras de cálculo, momento/modo de pagamento e responsabilidade pelo pagamento correspondente.
 
II – À luz de um juízo de (in)constitucionalidade, não se pode considerar haver uma manifesta desproporção entre o valor liquidado de honorários notariais (€ 15.180,66) e o custo implicado na partilha consequente à extinção da comunhão de bens entre os cônjuges, cujo inventário processado no Cartório Notarial tinha o valor de € 1.133.910,00, e veio a terminar por acordo entre os interessados na Conferência Preparatória, com subsequente homologação judicial.



27/12/2016

Bibliografia (445)


-- Blennerhassett, J., A Comparative Examination of Multi-Party Actions / The Case of Environmental Mass Harm (Beck/Hart/Nomos: München 2017)
 
-- Braun, Insolvenzordnung (InsO) / InsO mit EuInsVO (Neufassung) / Kommentar, 7.ª ed. (Beck: München 2017)
 
 
 

Apontamentos sobre a nova versão da LOSJ: 3. O que muda na competência cível (com consideração do novo RLOSJ)




Apontamentos sobre a nova versão da LOSJ:

3. O que muda na competência cível

(com consideração do novo RLOSJ)


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Legislação (66)


-- DL 86/2016, de 27/12: Altera a regulamentação da Lei da Organização do Sistema Judiciário e estabelece o regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais


Legislação europeia (Projectos e propostas) (29)



-- Proposal for a REGULATION OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL on the mutual recognition of freezing and confiscation orders (COM(2016) 819 final, de 21.12.2016)


Legislação europeia (25)


-- Decisão (UE) 2016/2386 do Tribunal de Justiça, de 20 de setembro de 2016, relativa às regras de segurança aplicáveis às informações ou peças apresentadas no Tribunal Geral ao abrigo do artigo 105.° do seu Regulamento de Processo (JO L 355 de 24.12.2016)

-- Decisão (UE) 2016/2387 do Tribunal Geral, de 14 de setembro de 2016, relativa às regras de segurança aplicáveis às informações ou peças apresentadas ao abrigo do artigo 105.°, n.° 1 ou n.° 2, do Regulamento de Processo (JO L 355 de 24.12.2016)
 
 
 
 

Apontamentos sobre a nova versão da LOSJ: 2. O que muda na competência cível




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2. O que muda na competência cível



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